A Reencarnação e Missão de um Espírito - Final
*Enoque Alves Rodrigues
Quando Cláudio se encontrava em meio ás dúvidas sobre qual caminho seguir, se optaria pelo atendimento aos ricos abastados ou se aos pobres carentes, eis que conhece Rosária, jovem bela, culta e rica, pertencente à família tradicionalíssima de Montes Claros que havia feito fortuna no ramo do comércio varejista. A paixão entre ambos foi avassaladora e poucos meses depois contraiam matrimônio passando a residir naquele casarão onde mantinham o luxuoso Consultório. Nove meses depois nascem um casal de gêmeos, duas criaturinhas maravilhosas e saudáveis que vieram alegrar ainda mais aquele lar.
Seus pais envelheciam naturalmente e como é de se esperar vinham também algumas enfermidades próprias da velhice. Cláudio, muito apegado aos pais, não titubeou em convencê-los a deixarem o Sitio para acompanha-lo, passando a residir todos em sua casa em Montes Claros. Quanto aos irmãos, permaneceram no sitio dando continuidade ao trabalho dos pais agora sob os cuidados do irmão bem-sucedido. A verdade é que Claudio, espirito encarnado, se sentia bem mais seguro ao lado dos pais que o cobriam de todo amor. Ele correspondia a tudo aquilo.
A cada dia que se passava a clientela composta por ricos e pobres, só se fazia aumentar. Ele vinha protelando a sua decisão e na medida do possível atendia a todos. Só que agora, como já mencionei em capitulo anterior, não dava mais. Ele não era onipresente e o seu tempo tornou-se exíguo demais para atender a tanta gente. Ele tinha de optar por uma de suas clientelas se quisesse levar adiante sua nobre missão de salvar vidas e de trazer novas vidas ao Mundo sem comprometer a qualidade e excelência de seu trabalho onde qualquer erro poderia ser fatal.
Cláudio, cujo espirito encarnado tinha como protetores os seus avós, desencarnados enviados do Plano Invisível para guia-lo, até então havia tomado todas as decisões acertadamente. Aproveito para enfatizar o seguinte: o espirito que anima o veiculo físico de todo ser encarnado é guiado por espírito desencarnado designado pelos Amigos da Luz em condições evolutivas infinitamente superiores as do espirito protegido que se submete as suas influências benéficas. Assim como o espírito encarnado, o “espirito guia” ou “protetor espiritual” necessita colaborar com o seu protegido em prol do seu próprio desenvolvimento e evolução. A comunicação entre ambos é através do pensamento. Estou confuso ou em dificuldade? Penso em meu guia e peço-lhe discernimento e proteção. Só que devemos sempre nos lembrar de que os espíritos guias não foram enviados para carregar a nossa cruz, mas somente para nos guiar. É para isto que fomos dotados do livre arbítrio que é a liberdade que temos de agir ou tomar nossas decisões cujas consequências nos levam exatamente à lei de causa e efeito que não se trata de punição de nossos desacertos, mas sim, de uma necessidade que temos de burilamento que consiste em aprendermos um pouquinho mais a cada dia com os nossos próprios erros em busca da evolução e perfeição a que estamos vinculados e afetos.
Ficou claro que não obstante serem os avós de Cláudio os seus guias espirituais, eles não iriam interferir em sua decisão a menos que ele solicitasse. Mas, ele não solicitou. Ele sabia o que estava fazendo. Não perderia a receita e status dos ricos nem abandonaria a clemência pelos pobres. Belo gesto.
Será?
Começou, inesperadamente, realocando o atendimento de sua clientela carente no Hospital Público. Para isto ele rachou a semana de sete dias ao meio. Metade dela em seu Consultório conjugado com imensa Clínica onde atendia aos ricos e a outra metade no Hospital Público onde atendia aos pobres.
Eureca! Por que ele não havia pensado nisto antes?
Tudo ia muito bem até que numa manhã o telefone toca em seu lotado Consultório quando ele se achava em meio a uma consulta de rica gestante.
- Dr. Cláudio, a dona Joana, sua paciente aqui no Hospital Público, está sofrendo terríveis contrações que prenunciam o parto em instantes...
- Não se preocupe, respondeu-lhe, Cláudio, o nascimento está previsto para daqui a quatro semanas...
- Doutor Cláudio, parece que a bolsa estourou!
- Por favor, procure outro colega para realizar os procedimentos por que eu estou com o Consultório cheio e depois nem é o meu dia de atender ai.
- Doutor, como o senhor sabe o caso da dona Joana é especial e não temos outro obstetra aqui. Somente o senhor conhece as peculiaridades e sequer o histórico dela se encontra conosco!
- Não posso sair daqui agora... Vejam ai o que podem fazer!
- Mas, Doutor, eu sou apenas uma atendente...
- Passe o caso para as enfermeiras. Elas sabem como resolver!
Cláudio desligou o telefone e continuou atendendo suas gestantes em sua Clínica particular.
Duas horas depois...
- Dr. Cláudio!
- Por favor, você outra vez?
- Desculpe doutor, mas estou ligando para informa-lo que a paciente dona Joana acaba de falecer...
Cláudio, agora aturdido correu para o Hospital Público onde, tristemente, constatou a veracidade daquela fatídica informação. Enquanto de um lado Joana jazia sem vida sobre uma maca, do outro, robusta criança faminta do leite materno cujos seios jamais sugariam, chorava nos braços de uma desesperada enfermeira como se a reclamar a perda da mãe.
Tomado pelo remorso saiu dali em desabalada carreira embrenhando-se nas densas matas que cercavam aquela Cidade onde ninguém o encontrou.
Passados trinta dias o belo e luxuoso Consultório foi fechado. Seis meses depois seu pai desencarnava de desgosto e saudades do filho. Algum tempo depois era a vez da mãe. A esposa, desorientada, sem saber o que fazer com aquele mausoléu colocou-o à venda. Os compradores o demoliram construindo ali um prédio residencial. Rosária contraiu novas núpcias.
Dez anos depois, quase irreconhecível, Cláudio era visto maltrapilho e alcoolizado, caminhando sem direção, pelas ruas de Montes Claros na condição de mendigo esmoler.
Como podem ver o Espírito Cláudio que tinha tudo a seu favor para levar adiante, com êxito, a sua missão e com isto amortizar na presente encarnação, débitos acumulados em encarnações passadas, fracassou, terrivelmente, por ganância. Ele preferiu ficar na cômoda situação de neutralidade na vã ilusão de agradar aos ricos que o mantinham e aos pobres que dele necessitavam. Só que a premissa maior para a qual reencarnou era exatamente a opção pelos menos favorecidos, apesar de sabermos que para Deus não há rico nem pobre. Todos nós somos iguais.
Cláudio era um mau espírito? Negativo. Não há espírito ruim. Todo espirito é bom, encarnado que é em igual condição de pureza. É a Centelha Divina que jamais se extingue, mas evolui lenta ou velozmente de acordo com cada encarnação.
Certamente que esta crônica teria um final feliz se o espírito Cláudio aqui encarnado tivesse se lembrado de uma Pérola do Mestre Divino que recomenda a todos nós: vigiai e orai para não cairdes em tentação (MT 26,41).
Não há, no entanto, culpados ou inocentes nesta história. Erros e acertos, assim como, cair e levantar, quantas vezes se fizerem necessárias são partes integrantes de nossa caminhada pela terra em todas as encarnações rumo à evolução plena.
Fraternal abraço.
* Enoque Alves Rodrigues é espírita