Descobrindo Nova Plumagem!
Conto Espírita
*Enoque Alves Rodrigues
Depois de ter servido por longos anos ao exército Romano nos tempos do Império, colhido, inesperadamente, por um petardo de um soldado adversário em pleno campo de batalha, eis que retorna à Pátria Espiritual o amigo Clarêncio Fachinni.
Devido ao trauma com que ocorreu o desencarne e premido por necessidades básicas de burilamento, acordou, enfim, meio que atordoado em lugar que ele desconhecia. Observava que ao seu redor figuras assustadoramente sobrenaturais os miravam e sorriam. Tentou, mas não conseguiu, de imediato, entender o que havia se passado com ele. Mesclava momentos de lucidez com horas e às vezes dias de extrema loucura. Nos raros instantes de equilíbrio fixava seu pensamento em algum ponto do firmamento na expectativa de que conseguiria decifrar as razões, motivos ou circunstâncias que o levaram até ali. Mas as Leis Infinitas são precisas. Quando ele estava próximo de descobrir tais causas, os amigos do invisível, os Espíritos de Luz se encarregavam de poupa-lo, tangendo para bem longe a conclusão que antes se avizinhava. Isso, ao contrário, deixava-o cada vez mais atarantado. Cada vez mais aturdido. Incomensuravelmente decepcionado. Ele era curioso. Ele estava sofrendo. Ele tinha de descobrir o que havia acontecido com ele. Até então a única consciência que ele tinha era a de que “havia mudado de plumagem”. Plumagem? Diabos, mas ele nem era pássaro! Pássaro? Bem, se pássaro era, onde, então, ficou o seu ninho? De onde ele vinha? Para onde ele iria? Onde é que ele estava?
Pouco ou quase nada ainda afeito ao mundo onde os espíritos habitam Clarêncio não sabia que ali os seres fluídicos não necessitam abrir a boca para se comunicarem. Eles o fazem através do simples pensamento. É por isso que eles olhavam para Clarêncio e riam. Liam-lhe os pensamentos como se palavras fossem sem que o pobre e recém-chegado Clarêncio percebesse.
Seguiram nesse diapasão meses a fio até que num belo e ensolarado dia alguém dele se aproximou. Havia aquele irmão desencarnado, recebido a incumbência de guia-lo. Mas, primeiro, tinha de instrui-lo. Sendo assim, nada melhor que começar pelo principio. Foi por isso que sem maiores delongas Samuel se aproximou de Clarêncio e depois de se apresentar, disse-lhe:
- Sei que estás curioso para saber o que aconteceu com você. Desejas, imensamente, entender os motivos que o trouxeram até nós. No entanto, meu dileto companheiro nada disso mais interessa. Tudo isto ficou para trás. O que vai contar mesmo é daqui por diante.
- Mas, espere um pouco, atalhou Clarêncio, você pode ao menos me dizer o que aconteceu comigo?
- Claro, posso, sim. Como não? – Você morreu lá embaixo na Terra. É por isso que você está aqui!
- Mas... Como assim? Morri coisíssima nenhuma! Você seguramente que é um desses espíritos zombeteiros que tem me infernizado desde que aqui cheguei. Eu não sinto nada. Não tomo aqui nenhum remédio e nem por isto sofro qualquer dor, tampouco tenho sede ou fome. Nunca estive tão bem e disposto. Sinto-me como se estivesse livre, leve e solto. Veja!
Disse isto e sem qualquer esforço volatizou como se voando estivesse.
De soslaio, o Anjo pode observar apenas as perninhas de Clarêncio que plainava deslumbrado, como uma criança, com sua nova capacidade locomotiva, em radicais manobras aéreas. Não era um sonho de Ícaro. Ele não tinha asas, mas estava voando sim senhor. Em que outro estado ou condição isso poderia ser possível?
Pois é!
Piedosamente, mas com um leve e angelical sorriso nos lábios só restou Àquela Entidade que estava ali para orientar Clarêncio pelos caminhos difíceis que ele ainda percorreria concordar, balançando, positivamente com a cabeça.
- Perfeitamente...
- É por isso mesmo, amigo...
- Você morreu negão!
Fraternal abraço.
* Enoque Alves Rodrigues é espírita