CONVERSA NO ALÉM III – UM PULINHO NO CÉU!
Conto Espírita
*Enoque Alves Rodrigues
Fumante inveterada, a cada minuto que se passava, Abigail Figueiredo era aos poucos consumida por aquela doença grave e incurável. Chegou ao estágio terminal. Ela estava literalmente “com o pé na cova”. Os Médicos a desenganaram há muito tempo. Mantinham-na ainda internada naquele Hospital apenas para cumprir meras formalidades e também por pertencer á família de posses que não queria leva-la para morrer em casa.
Todo o histórico da enfermidade de Abigail era passado pelos Médicos aos seus familiares, de maneira que ela mesma não tinha noção a respeito de seu próprio estado. Há médicos que entendem essa forma como a mais apropriada e pensam que assim procedendo estão poupando o paciente de maiores dissabores. Em que pese compreender mencionada preocupação, particularmente acho que em qualquer que seja a circunstância e gravidade da doença, o principal interessado é o paciente. Portanto, ele sim tem todo o direito de tomar conhecimento em primeiro lugar do que lhe ocorre. Isso se chama respeito ás individualidades às quais todo espírito está afeto. Resumindo, Abigail sabia que seu estado de saúde não era bom, mas não tinha a menor ideia de sua gravidade.
Nesse entrementes, em vigília ou transe, premida pela fraqueza da matéria e elevação da alma quando os laços fluídicos vitais que prendem a alma ao corpo se arrefecem obedecendo aos comandos da Força Motriz Universal, o espírito desprende-se de maneira temporal do veiculo físico e, monitorado ou conduzido por desencarnados evoluídos, passa a visitar, amiúde, outros Mundos como se estivesse em veraneio por que retorna novamente e incorpora animando a mesma matéria. Rudimentarmente explicitando, é o que a Ciência denomina de catalepsia patológica. Já ouviu falar?
Pois é!
Aquela irmã estava “dando muito trabalho”. Os amigos do Além já não podiam se descuidar um minuto sequer. Um átimo de segundo e, zás... Lá estava ela testando as condições voláteis concedidas aos espíritos que abandonaram em definitivo a vestimenta densa. Ela não se definia, pois, não era só espírito por que ainda não tinha morrido e respirava dentro da carcaça, tampouco era só matéria por que como eu já relatei, ela há muito tempo se encontrava com um dos pezinhos melindrosos na cova. Mas, caramba, por quais razões não se definiam de uma vez o seu estado?
Enquanto isso, uma Plêiade de iluminados seres invisíveis a observava a partir da porta de entrada daquele Hospital. Discutiam o que fazer com ela. Dizia um grandalhão, de barbas pretas e bem cuidadas, que parecia ser o chefe.
- Epaminondas, meu dileto amigo, temos de fazer alguma coisa logo antes que nossa irmã acabe por passar os pés pelas mãos e assim comprometa a excelência da nossa missão...
- Entendo meu bom senhor, mas conforme sabemos a hora ainda não é chegada. Não somos autorizados a “puxar ninguém” antes do tempo!
- Sei disso, meu caro, mas temos de encontrar uma solução por que a presente situação nos está fugindo ao controle... Esta irmã não sossega um só instante... Está sendo difícil acompanha-la...
De repente, entre pasmo e assustado...
- Chefe Aníbal!
- Fala aí, meu bom Epaminondas... Do que se trata? Que mal o aflige?
- Mestre, aquela fumacinha que acaba de passar pela porta do quarto 512, o que será?
- Como?
- É ela, Mestre... É a Irmã Abigail, evaporando-se de novo... Ela está fugindo, mestre. Olha lá!
- Não é possível, não acredito Epaminondas...
- Pode acreditar Mestre... É ela sim...
- Irmã Abigail?
- Pois não!
- Onde é que a senhora pensa que vai? Quem foi que lhe disse que a senhora pode subir? A senhora tem de retornar ao seu corpo para aguardar Ordens Superiores...
- Negativo, disse-lhes, assertiva, irmã Abigail!
- Como, negativo? O que a senhora quer dizer com isso?
- Simples... Finalmente os meus entes queridos pararam de chorar em minha cabeceira e assim, os Médicos aproveitaram para me informar, balbuciando-me, diretamente aos ouvidos: “Pode subir. Você morreu negona!”.
- Puxa vida, irmã... E nós perdemos essa... Deixamos de cumprir com a nossa missão... Não estávamos lá para colaborar no vosso desencarne... Por favor, não conte nada ao Chefão lá em cima... Não podemos pagar esse mico!
- Subamos, disse-lhes irmã Abigail, daqui até “Nosso Lar” ainda tem muito chão...
- Nosso Lar?
- Sim, Nosso Lar!
- E quem foi que disse que a senhora vai pra “Nosso Lar?” – Indagou-lhe o líder Aníbal.
E acrescentou...
- Ninguém, por mais santo que tenha sido o que não é o caso da senhora que não foi uma boa abelha, pode subir direto. Por enquanto “vosmecê” fica aqui no Umbral... Os Médicos materiais a liberaram lá embaixo, mas nesta Jurisdição os mandatários são outros. Quando eles definirem o que fazer com a senhora, nós retornaremos para prosseguirmos viajem...
- E quanto tempo isso pode demorar? - Quis saber irmã Abigail.
- Dez anos Celestes, aproximadamente, responderam-na.
- E o que significa isto?
- A senhora ainda se lembra de quantos dias é feito um ano lá na Terra?
- Sim. São Trezentos e Sessenta e Cinco dias!
- Perfeitamente!
- Ih?
- Aqui, nestas paragens onde nós nos encontramos, cada ano Terrestre equivale á um dia... É só a senhora fazer as contas...
- Não... Isso não é possível... Eu quero voltar... Lá na terra, apesar de todo aquele inferno, é muito melhor!
- Agora não dá mais, irmã, disse-lhe o chefe da equipe... Dê uma olhadela lá embaixo. Viu? O coveiro bebum, tremendo pé de cana, acaba de jogar-lhe a última pá de terra com cascalho sobre o “corpitio”. A senhora veio em definitivo. Seu desenlace irreversível acaba de ser homologado pela Chefia... O seu tempo de veraneio já passou... Agora, só na “próxima” encarnação!
- Próxima encarnação? E Vocês aqui, seus tontos, ainda chamam isso de Próxima?
- “Próxima encarnação uma ova!”.
Fraternal abraço.
* Enoque Alves Rodrigues é Espírita.