Toda Provação é Necessária!
Conto Espírita
*Enoque Alves Rodrigues
“Bem-vindo ao mundo dos vivos!”. Foi esta a frase que Natanael escutou tão logo adentrou desconhecido recinto depois de finalmente ter abandonado as vestimentas terrenas. Ele nada entendeu. Não tinha, até aquele momento, qualquer noção a respeito de sua nova vida.
Havia desencarnado de causas naturais na cidade de Curvelo, nas Minas Gerais, em idade já avançada quando, pelo que se supõe a visita da morte já é de certa forma esperada e quase desprovida de surpresas e sobressaltos. Mas, no caso de nosso amigo Nata à coisa foi um pouco, ou melhor, muito mais além, por que, obedecendo aos desígnios superiores os quais não nos cabem questionar, por fugirem ao extremo conhecimento humano já que tudo que se sabe a esse respeito não passa de teorias desprovidas de embasamentos espíritas ou científicos, teve o desprazer de observar a decomposição de seu veículo físico. Ele, desencarnado, passava dias e noites, anos a fio, observando aquele processo tenebroso.
Nesse entrementes, muito dissabor teve de enfrentar. Do seu desencarne até aquele momento sublime das “boas vindas” decorreram-se exatos três anos terrestres. Antes disso, claro, teve ainda de “amargar” momentos difíceis no Umbral nas proximidades da crosta terrestre. Ninguém “sobe direto”. Ali ele convivia com espíritos de irmãos recentemente desencarnados no planeta de expiações e provas em grandes conflitos de adaptação naquelas plagas de estadias transitórias. Natanael ou Nata desejava a todo custo se libertar dos grilhões que o prendiam, ainda, à matéria densa. Mas nem sempre as nossas vontades estão em sintonia com as vontades do Criador Supremo. É exatamente por desconhecermos as coisas do “além-túmulo” é que sofremos.
Entretanto o nosso companheiro tinha lá seus motivos. Ele inconscientemente se recusava a desprender-se. Ele não queria partir. Mais também não queria ficar. Bem, agora, mesmo que o desejasse, não tinha mais como permanecer na terra, pois o seu corpo físico não mais existia, por que ele presenciou todo o processo de degeneração. Ele viu até mesmo o momento em que o primeiro e atrevido verme se apoderou de seu belo corpo. Sim. Ele era um velho que cultivava, em vida, sem vaidades, o culto ao corpão sarado por intermináveis sessões de físio e “otras cositas más”.
Volvemos a seriedade do assunto. Pois o motivo principal que o havia retido aqui em baixo era bem mais sério, ou seja, a existência de seu filho de nome Charles de dezoito anos que reencarnou em seu lar com paralisia infantil ao qual ele assim como todo bom e zeloso pai se prendia pelos laços do afeto, carinho, devoção, cuidados e responsabilidade paternal. A esposa, apesar de zelosa, muito mais jovem que ele, jamais aceitou aquela situação. Ela cuidava muito bem do garoto, mais não era com o afinco que casos dessa natureza exigem. Na realidade, o peso maior daquele bem-aventurado fardo era conduzido pelas costas do amigo Nata que em nenhum momento de sua vida material reclamou. Ao contrário, agradecia todos os dias pela força que o plano invisível lhe dava para levar adiante aquela cruz. Foi por isso que ele se achava intrinsecamente apegado ao menino. Seriam estes os motivos pelos quais Nata, agora desencarnado, “pagava os seus pecados?”. Que pecado, afinal, cometera? Desde quando ser bom é pecado? É evidente que não. Nesse caso ninguém sofre por ser bom!
O que ocorre é que ao reencarnarmos trazemos conosco débitos contraídos com o pretérito os quais muitas vezes necessitam de várias encarnações para o seu inteiro resgate. As reencarnações além de serem prêmios para o espirito, também são decisivas e determinantes em sua verdadeira purificação que vem junto com as provas em prol de seu burilamento na erraticidade. Errado está quem acha que devido determinado individuo ter palmilhado este mundo nos caminhos do bem numa encarnação, ao desencarnar, está com os seus débitos “zerados” perante as Leis do Criador. Nada disso. Se assim fosse muitos que aqui foram canonizados como santos não retornariam. Eles voltam exatamente para cumprirem suas missões pendentes de resgates. Ou você pensa que Deus, causa primária de todas as coisas, mandaria alguém para cá em veraneio? Sem nenhum propósito? Sem qualquer missão? Engana-se!
Em assim sendo, quem, afinal, somos nós para afirmarmos que já sofremos o suficiente ou que alguém não devia sofrer tanto? Ainda que você conheça integralmente a retidão da pessoa e espirito com quem você convive na atual encarnação, você não saberia quais foram os débitos que ela contraiu nas encarnações passadas. Isso é “COISA DE DEUS!”. Não é da sua conta.
Portanto.
Pensem nisso!
Fraternal abraço.
* Enoque Alves Rodrigues é espírita