CONVERSA NO ALÉM XXVII - O DESENCARNE DE LINDALVA QUINTANA
Conto Espírita
*Enoque Alves Rodrigues
Com a idade de oitenta e dois anos, depois de padecer por longo tempo de incurável enfermidade, Lindalva Quintana agora estava sendo preparada por desencarnados para retornar ao “Mundo Etéreo”, ou seja, á Pátria Espiritual. Deixaria, finalmente, no Planeta Terra de expiações e provas, aquela sua pesada carcaça em estado calamitoso de corrosão causada pelos longos anos de padecimento. Libertaria, por fim, dos laços e de todas as dores pelas quais havia passado o seu veículo físico.
Do período embrionário até o estágio terminal da doença Lindalva passou por três fases onde se viu frente a frente com a morte. Inclusive na terceira e última fase em coma profundo, irreversível, quando os médicos consideravam-na morta, eis que retornou aparentemente bem mais disposta e corada. Daquela fase até a fase atual ela até ganhou peso e parecia ter se curado.
Frequentadora de certa Igreja fora chamada várias vezes ao púlpito pelo pastor Alan para ali dar seu testemunho de cura plena. Nestas ocasiões, instada pelo êxtase generalizado dos fiéis e do próprio pastor, se empolgava e em grande júbilo e euforia batia no peito e dizia-se curada em nome de Jesus. Quando Lindalva prestava seu testemunho, à igreja toda entrava em transe. Ela era o exemplo inquestionável de que quando se crê nunca se morre.
E ela contava a todos o que tinha visto lá em cima. Falava da “barba” de Deus ás azas dos Anjos. Claro, ela fantasiava tudo aquilo de acordo com sua crença e imaginação. E todos nela acreditavam, até por que não tinham como contestar. Daquele grupo ninguém antes houvera estado do outro lado. Isso era privilégio de Lindalva. Por isto ela, empolgada, alardeava aos quatro ventos aquela façanha. Na rua era apontada por todos como “a mulher que morreu e ressuscitou!”. É próprio do ser humano não contestar aquilo cuja contraprova não lhe esteja ao alcance das mãos. Nestas circunstâncias mesmo não acreditando é melhor fingir-se de crédulo. As coisas espirituais não precisam de provas materiais para existir. Tampouco para atingir todo e qualquer nível de convencimento. Mas a “carne é fraca”.
Foi por isso que quando nossa querida irmãzinha Lindalva teve aquela recaída ninguém acreditou que ela desta vez partiria. Aliás, sequer a visitavam. Para que? Se ela não morreria? Em seu leito, rodeada pelos familiares conversava, calmamente, sobre amenidades. Relatava que em sua mente vinham recordações de tempos vividos desde a primeira hora de seu nascimento. Que a fita de toda a sua longa existência corria frente aos seus olhos como se fosse um vídeo tape. Agora se via toda vestida em seu belo enxoval dentro da Igreja Matriz de São José dos Campos tal qual se achava no dia de seu casamento... E a fita corria... E ela conversava... Chegou, por fim, ao momento atual.
À sua frente Carminha e Eusébio a observavam, pacientemente. Ambos haviam sido seus avós em encarnações passadas e ali estavam para colaborar com ela no grande momento assim como pelos caminhos que percorreria até a verdadeira morada. Eles a conduziriam ao Nosso Lar tão bem retratado pelo Espírito André Luiz onde permaneceria por algum tempo depois de passar pela Crosta.
Dessa maneira, sem que ninguém acreditasse, em um átimo de segundos eis que parte nossa amiga Lindalva. Serena. Tranquila e com a consciência de que soubera aproveitar aqui os dias que o Criador lhe concedeu. Na verdade nem ela própria acreditava que desta vez seria para valer. Mas foi.
Em seu féretro, por mais incrível que possa parecer ninguém compareceu. Para que? Se ela com toda certeza voltaria! Quem foi que disse que ela ia morrer?
Claro. Ninguém morre. Apenas mudamos, de quando em vez, de vestimenta para retornarmos melhores do que fomos, ou talvez, quem sabe, mais bonitos e charmosos, caso Deus assim nos permita.
Mas o certo é que até hoje ninguém em São José acredita que Lindalva desta vez ficará um bom tempo sem “dar as caras” por aqui. Essa dádiva, como já disse, é concessão do Supremo sobre a qual não nos cabe especular.
Fraternal abraço.
* Enoque Alves Rodrigues é Espírita e Escritor.